quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

O espírito necessário para realizar um Kata

                                Equipe Garutti
Conta uma lenda que um mestre de Karatedō em suas andanças numa noite de lua cheia pressentiu no barulho feito pelos galhos secos, ao transpor numa clareira na mata, a presença do mal.
São salteadores armados, em tocaia pensou. Seu instinto guerreiro e defensivo o coloca em Kamae, atitude de luta. Está imóvel, abdômen contraído, punhos cerrados. Atento, olhando para o “nada” e vendo tudo (Zanshin). Altamente concentrado, espírito vivo e aguçado. Preparado para lutar!
Seu repudio pelo mal, seu Karategi intocável, sua honra, seu nome e sua vida, tudo está simbolizado em seu Kamae.
Sua mente visualiza ao longe, num halo de luz, seu velho mestre, que em atitude Zen, isso o inspira. Suas sábias palavras de ensinamento ecoam ainda:
“Antes que lhe toquem a pele, toca-lhe os ossos”.
Inconscientemente coloca-se em Musubi-dachi e faz Yōi, logo curva-se reverente e diz Onegaishimasu, voltando rapidamente a Kamae.
É atacado! Pela esquerda, brilha uma lamina. Coloca-se rapidamente em Neko-ashi-dachi, consciente e veloz bloqueia Chūdan-otoshi-uchi-uke e ataca Chūdan-oi-zuki com Kime na base Han-zen-kutsu-dachi. As suas costas, um segundo oponente ataca com uma lança. Bloqueia firme e forte.
Ele sabe que “deve enfrentar o adversário, mas nunca seu ataque”.
Está na base Zen-kutsu-dachi e defesa Gedan-barai. Recolhe o pé caindo em Han-zen-kutsu-dachi e girando o braço evita outro ataque do adversário, outra vez com Chūdan-otoshi-uchi-uke. Completa com um soco (Chūdan-oi-zuki) seco, na mesma base, tirando toda chance do agressor.
Da esquerda ouve um zumbido. É o terceiro agressor. Como um raio, coloca-se em Zen-kutsu-dachi e realiza um bloqueio Gedan-barai. Quase simultaneamente um bastão corta o ar cobrindo a lua, várias vezes. O inimigo bate recuando de cima para baixo. As defesas agora são Jōdan-age-uke protegendo a cabeça, a fim de partir o braço na altura do cotovelo, continua na base Zen-kutsu-dachi. Nesse golpe o mestre emprega toda sua força e toda sua velocidade. Solta um grito do fundo de suas entranhas; um grito de guerra num berro de morte: “É o Kiai”. Nada o detêm. Há uma transformação total no corpo e no espírito. A mutação de força em poder; de massa em energia, de água em fogo. Estar possuído de Kiai é despertar a arma mortal, o Karatedō. Silêncio na mata. Passa a perplexidade.
É atacado pela diagonal do lado direito. O mestre gira o campo de luta, defende Gedan-barai em Zen-kutsu-dachi e ataca Chūdan-oi-zuki na base Han-zen-kutsu-dachi. O instinto vira-lhe a cabeça quando na outra diagonal o primeiro atacante insiste com a faca. Suas pernas trocam de direção sua base. Rolando seus quadris como um eixo, seus braços tal uma espada – acompanhando o impulso do corpo – descem em diagonal. No momento do contato dos braços, um acréscimo de velocidade e torção desarma o adversário com Gedan-barai. Antes que tente recuar é alcançado com Chūdan-oi-zuki, repetindo a sequencia de bases utilizadas anteriormente.
O terceiro ergue-se a sua esquerda estocando-lhe com um bastão, recebe um Gedan-barai em baseZen-kutsu-dachi e um Chūdan-oi-zuki andando en Han-zenkutsu-dachi; como resiste mais dois Chūdan-oi-zuki, sendo o segundo com Kiai. O Kiai dá-lhe firmeza, força e resolução de parar o adversário, no Karatedō, não há meia defesa, nem meio ataque.
Desesperado o da esquerda bate com a lança da direita para esquerda de fora para dentro e vice-versa. O mestre gira em base Shikō-dachi e com dois cutelos (Gedan-shutō-barai) parte a arma. O Último imita a agressão e sente no poder das mãos em forma de faca, a devassar a mata ao redor, o poderio do Karatedō.
A luta chega ao fim. Por um instante mantém-se imóvel na última defesa (Zanshin). Volta à postura inicial de Kamae. Lembra seu mestre em sua posição de Zen e procura-o. Em vão; já não consegue vê-lo mais.
Isso é Kata... isso é Karatedō.

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